terça-feira, 8 de julho de 2014

Capacidade de sentir

A propósito da relação entre o espaço e o tempo (e vice-versa) lembrei-me de uma curta mas significativa história que o padre Marcelo Barros de Sousa – monge beneditino, escritor e teólogo brasileiro – contou numa palestra realizada, no dia 14 de Janeiro deste ano, na Faculdade de Letras de Lisboa, integrada num painel sob a temática “Ecologia e Espiritualidade”. Será conveniente salientar que Marcelo Barros desenvolveu, no âmbito da Teologia da Libertação, um ramo próprio que designou “Teologia da Terra”1. Esta, para além de um marcante pluralismo, aberto a outras culturas e religiões (mormente dos povos indígenas e negros brasileiros), distingue-se por apresentar uma forte componente holística de ligação à Terra, às origens, a uma espiritualidade ecológica2. Esse peculiar clérigo afirmou precisamente, na aludida palestra, que descobriu «a espiritualidade ecológica não na comunidade beneditina mas nos indígenas brasileiros e nas comunidades negras do candomblé».
Ora, feito este introdutório enquadramento, vamos então a essa pequenina narrativa em jeito de parábola:
Numa viagem de carro, que decorria numa serra brasileira, um chefe índio mandou parar o veículo, saiu para o exterior e quedou expectante… O condutor branco, passado algum tempo, perguntou-lhe se estava com algum problema; ao que o índio respondeu: você veio muito depressa e a minha alma não conseguiu acompanhar. Estou à espera da minha alma. Quando eu perco a alma, reconcilio-me, ligo-me à natureza, canto,… E vocês quando perdem a alma o que fazem?



Notas:
1. Para conhecer o seu pensamento, destacamos, de entre a sua obra literária, A Secreta magia do caminho (Nova Era, 1997), O espírito vem pelas águas (Loyola, 2008) e Teologia pluralista libertadora intercontinental (Editora Paulinas, 2008).
2. Marcelo Barros teve o cuidado prévio de diferenciar “espiritualidade” e “espiritualismo”, tal como “espiritual” e “espiritualizado”. Espiritualidade será a vida conduzida pelo Espírito Santo, a vida verdadeira… De que decorre a questão: como ter uma vida verdadeira numa Terra destruída [ou significativamente adulterada…]?

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